12 setembro 2009

Detesto o silêncio

Não o silêncio do meu quarto, mas sim o silêncio entre duas pessoas.

Naquela noite, tínhamos ido ao teatro. Ela, como sempre, foi crítica até demais: achou a iluminação ruim e a acústica mal implementada. Eu achei legal. A atriz principal interpretava Elektra filha de Agamênon, e tinha uma voz levemente fanhosa. Coisa besta, que quase ninguém deve ter percebido (talvez pela acústica ruim), mas eu percebi. E imaginei a Elektra de verdade - se houver existido uma - sofrendo com problemas de dicção. Ri disso. Ela não entendeu o motivo do meu humor. Fechou a cara e recomeçou a criticar a iluminação.

De lá passamos num supermercado pra comprar bebida. Ela dirigia e isso sempre me deixou incomodado - o fato de depender do carro dela para saírmos. Acho que é uma das atitudes ditas provincianas que eu não conseguia largar. Mal dos homens do interior. Por isso eu fazia questão de pagar suas coisas. O ingresso do teatro, a conta do jantar e a garrafa da vodka com frutas. Poderíamos beber ali no estacionamento, mas com a lei seca os polícias de Brasília andavam rondando esses locais exatamente com a intenção de flagrar motoristas bebendo pra multá-los logo adiante; por isso fomos pro mirante. E no carro mais uma vez: silêncio.

Descemos a pista do mirante ao lado da ponte, ela estacionou no gramado onde antes havia um carrinho de cachorro quente. Descemos do carro, eu com a garrafa na mão e ela com um casaco, braços cruzados bem apertados contra o peito. Resolvi quebrar aquele gelo:

- acho que vai chover. olhei para o céu - nublado, mas sem sinal de chuva.

- acho que a gente tem que beber. ela me disse e se aproximou de mim, passando o braço pelo meu, me trazendo para perto.

Sentamos na grama e eu pelejei para abrir a garrafa. Uma, duas, três tentativas. Mais uma surra no meu ego masculino, e como de costume xinguei alguma coisa. Ela riu. E eu abri a garrafa, passei pra ela e fiquei torcendo minha mão direita. Gole curto. Careta. Gole longo.

- o lago a noite é lindo. me lembra o mar.

- é. (ela tinha me passado a garrafa)

- e se tiver greve?

- se tiver greve eu vou pra casa. que se foda o estágio.

ela torceu o nariz. eu havia comentado sobre o estágio, mas não sobre ela. sobre nós. Ficamos em silêncio mais uma vez.

- Detesto o silêncio... Esses silêncios que incomodam. Sabe como você sabe quando tem uma pessoa pra vida toda? Quando você pode ficar em silêncio com ela por quarenta minutos inteiros e não se incomodar com isso.

- isso é do Tarantino? (ela perguntou depois de eu tê-la devolvido a garrafa).

- Tarantino. Sim.

- você tá ficando bobo com esses filmes... (me devolve a garrafa sem beber).

Eu bebo. Mais pela frustração do que por vontade. Enquanto estou bebendo não tenho que falar. E agora, algum tempo depois, posso pensar direito sobre o ocorrido. Eu já tinha perdido. Ela já não queria mais.


Passei a garrafa.

Aproximei pra beijá-la - nós homens tentamos às vezes corrigir certas coisas com beijo ou sexo, algumas delas detestam isso.

Ela afastou o rosto.

- eu quero ir embora... nem me olhou quando disse.

- eu quero ficar.

olhava pro lago. e pior do que o silêncio, é o gosto da frustração. Aquela frustração que senti quando ela se levantou sem me dizer uma única palavra, entrou no carro e se foi. Mais uma vez, silêncio. Ela não estava lá, mas o silêncio entre nós havia ficado. Pelo menos restava a garrafa. Vodka e frutas vermelhas. O lago. A ponte. Bebi até os ônibus começarem a passar.

Ainda detesto aquele silêncio.

6 comentários:

Anônimo disse...

Alguns silêncios são extremamente ruins. Outros bons... Alguns necessarios. Eu gosto so silêncio, Gui.

Andrielly H. disse...

*______* Eu vou ser bem sincera, eu não suporto o silencio!!!!!
Quando ta todo mundo quieto, começa me dar um treco hsauhsauhsuahsua
eu tenho que fazer alguma coisa, eu tb não tenho paciencia pra nada, minha mãe faiz tempo foi me colocar no balé... ooo decepção, eu só fiquei 1 dia e olha lááá ein ahushaushaushashua

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Beijosssssss

Tenorius disse...

e eu q fui ao cinema na seman pssada ver pulp fiction num silêncio dois... amiga com namorado é triste, inda mais se for daquelas bem rígidas...

Bárbara Freitas disse...

Eeeeei senhor Guilherme!!! Vc tb é blogueiro, que legal!!!
Como vc descobriu o CT&B?

beijos e eu odeeeeio silêncio, com ou sem intimidade.
;)

Clara disse...

O silêncio entre pessoas é extremamente desagradável...
Já o silêncio do quarto é uma coisa com a qual eu poderia conviver alegremente durante toda a eternidade.
Ou talvez não tão alegre, mas reflexiva, confortável... alegria é algo que depende de uma elevation.

eloisa disse...

Você poderia escrever livros, com todas essas narrativas. Eu compraria.
Sabe quando você começa e não consegue parar? pois é.